Os três macaquinhos
Existem várias maneiras de “sair de fininho”, desde as mais comuns até as mais criativas. A condição especial é a de que o autor de tal façanha consiga ausentar-se da cena, sem ser identificado ou se omita dela. Dito assim pode parecer uma tarefa fácil, mas analisando melhor, verificamos que de fato não é. Ademais, exige inteligência, ousadia, senso de oportunidade e muito do que não nós acostumamos a chamar de “cara de pau”. Afinal, quem já não escondeu um pum, dentro de um elevador lotado por detrás de um sorriso amarelo e um... -Bom dia! Sobretudo em certas circunstâncias, ”sair de fininho”, significa salvar a pele. Lembro-me de um episódio aos meus oito anos de idade aproximados. Passávamos os finais de semana na casa de minha avó materna. Bem... ela morava numa casa enorme. Com amplos quartos, grande quintal, uma horta e muitas flores. Ficava no bairro do Chora Menino, em São Paulo, reduto da colônia portuguesa, no início do século passado. Sempre aos domingos, minha avó reunia toda a família, tias, primos, todos ali, para o almoço. Ao longo dos anos, aquele encontro tornou-se uma tradição. Daí que, naquela manhã , quando corria pelo quintal, topei com um vaso de flores pousado sobre o muro do jardim. Não teve jeito, foi um desastre. Lá se foi o vaso para o chão, em pedaços e suas flores destruídas na queda. Aquilo para mim significava, bronca, surra e castigo, nesta ordem, na teria jeito. Na minha cabeça infantil, só restava uma saída, esconder-me e rápido. Sem ser percebido, entrei no quarto do meu tio pela janela aberta e instalei-me debaixo de sua cama. Sabia que ele só voltaria à noite, e assim teria tempo de pensar em outra coisa. Com o passar das horas, foi se aproximando o horário do almoço. Minha mãe, aos berros começou a chamar-me: -Cláudio, vem almoçar! Chamou uma, duas, três vezes. Esperou, tornou a chamar e nada. O fato é que, estranhando minha ausência, colocou meus primos e tias no meu encalço. Permaneci imóvel. A cama de meu tio era grande e tinha a colcha estendida até o chão de modo que mesmo que ingressassem no quarto, não me encontrariam. Quando minhas tias, acompanhadas de minha mãe e avó saíram a minha procura e encontraram o vaso quebrado, no chão do quintal, senti um calafrio. Minha mãe, conhecendo-me bem, ligou os fatos e ameaçou... -Cláudio apareça já, se não, será pior. Temendo o que ela chamou de pior, sai de meu esconderijo e apareci com minha cara de anjo... Sorte que, minha avó, que me adorava, veio imediatamente ao meu socorro dizendo: -Não fales assim... deixai-o... é apenas um menino. Enfim, amparado por minha avó, a salvo, fui com todos para o almoço. A saída de fininho tem a vantagem do ganho de tempo e da redução da carga emocional em torno do fato ocorrido e até em alguns casos do seu esquecimento. Caso não fosse a intervenção de minha avó, a história teria acabado um pouquinho diferente. Diferente também é o tratamento dado a este tema no mundo adulto, no qual alguns comportamentos são inadmissíveis e condenáveis. Haja vista, quando quinze anos mais tarde, iniciava minha carreira em vendas, vivi uma experiência que representou para mim, um importante aprendizado. Era promotor de vendas, visitava um grande cliente varejista e estava na sala de espera de seu departamento de compras. Atrasado em minha agenda, tomei a frete de outro vendedor, sem que ele percebe-se, pois tinha ido ao banheiro. Já que não éramos os únicos na sala, senti-me mais a vontade para fazer aquilo. Como iria apenas colher uma assinatura, imaginei que seria um contato rápido e que minha ausência da sala nem seria notada. Por acaso a demora foi maior que o previsto e ao tentar “sair de fininho”, topei com aquele vendedor que havia saído do banheiro há algum tempo e estava a minha espera... Foi uma cena constrangedora, ele tinha talvez o triplo de minha idade, cabelos brancos, um ar de sabedoria que só o tempo confere e quando tentei inutilmente explicar-me, ele após ouvir-me pacientemente, educadamente disse: -Você certamente é muito jovem e pelo visto tem muito há prender. Aconselho-o que não repita mais isso. Se tivesse me solicitado a vez teria cedido sem problemas... Há situações nas quais simplesmente não da pra pensar assim: vou fingir que não é comigo e “sair de fininho”. Nem tão pouco fazer como os três macaquinhos: não vejo, não falo, não ouço. Sem dúvida a melhor maneira de “sair de fininho” é fazer bem feito e ter uma boa justificativa se for pego, se não “dança-se” de vez. Muito menos adiantará apelar para avó, até porque se ela estivesse por perto, conforme o delito, morreria de vergonha ou cairia de pau em cima do neto sem vergonha... Claudio Lima
Enviado por Claudio Lima em 09/08/2011
Alterado em 02/11/2015 Copyright © 2011. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |